A morte de Jonas Savimbi, faz hoje cinco anos, marcou o final da “Guerra Esquecida”, como era conhecida no Ocidente, que matou o futuro de três gerações. Foi, para uns poucos, pretexto para abrir garrafas de champanhe. Porém, cedo, mas muito cedo mesmo, deram conta que a morte do fundador do Galo Negro constitui(u) “má notícia” para todos aqueles, sejam eles do MPLA ou ainda da UNITA, mesmo que da Renovada, por ter aberto caminho para o impedimento do enriquecimento fácil à sombra da guerra.
Com a irreverência e frontalidade características da sua juventude e a tímida coragem permitida pela mão circunstancialmente aberta do Sistema que senhoria Angola, o líder parlamentar do Partido de Renovação Social (PRS) afirmou, no dia 19 de Fevereiro de 2005, em declarações à agência Lusa, que “a morte de Jonas Savimbi e o consequente fim da guerra não permitiram melhorar as condições de vida dos angolanos”.
Lindo Bernardo Tito, que em 1991 deixou os microfones do grupo Rádio Nacional de Angola (RNA) na emissora provincial da Lunda Norte para abraçar a terceira maior força política nacional de corpo e alma, deverá saber que as suas palavras, apesar do tempo levado pelo tempo do nosso tempo, continuam válidas hoje e, quem sabe, continuarão a ter o mesmo valor amanhã caso a fina flor preconceituosa do poder angolano, à semelhança do tristemente célebre regime português de António de Oliveira Salazar, continuar a pautar pelo autismo esquizofrénico e desprezo suicida pelas aspirações e necessidades primárias do povo como tem acontecido de 1975 à presente data.
As palavras do tribuno à Assembleia Nacional pelo PRS, relativas à morte de Jonas Savimbi, continuarão certamente a ser válidas por muito mais tempo (cinco, dez anos ou quem sabe mais) caso se continue a pensar nos corredores do poder (absoluto) que no País existem cidadãos de primeira e de segunda e que a pretensa democracia das Ingombotas (Luanda) é extensiva ao resto de Angola.
A morte de Jonas Savimbi permitiu, quinze dias depois, o alcance da paz mas não operou mudanças dignas de registo na vida social e económica do cidadão comum, o que quer dizer que a “puta” da vida continua a mesma. Ou seja, de mal a pior. Dito de outro modo: se Jonas Savimbi, morto aos 67 anos, era uma mosca incómoda, então quem o combateu é uma “merda” que continua a mesma… e cada vez mais mal cheirosa.
Jonas Savimbi morreu, mas milhares de angolanos continuam, no alvorecer de cada ano lectivo, a não ter acesso ao Ensino de Base, Médio e Superior. Os angolanos, pior do que antes de 22 de Fevereiro de 2002, continuam a morrer por falta de dinheiro para pagarem nos hospitais. Agentes da Polícia Nacional inverteram o seu papel. Ou melhor, ao invés de protegerem os cidadãos combatem-nos.
A crítica ao Governo continua a ser entendida como uma afronta. Filiar-se num partido que não seja o MPLA é sinónimo de proscrição da Função Pública e do desprezo da sociedade medieval que, infelizmente, ainda existe em Angola. Enfim, uma imensidão de exemplos que poderiam ilustrar que a morte de Jonas Savimbi “rebentou” como chapéu de chuva da má vontade política do governo no que respeita aos cumprimentos das suas responsabilidades.
Jonas Malheiro Savimbi (1934 – 2002)Jonas Malheiro Savimbi nasceu em Munhango, província angolana do Bié, em 1934. Passou a infância no sul de Angola entre o povo Ovimbundu, o maior grupo étnico do país, e ao contrário da maioria das crianças angolanas frequentou a escola e era considerado um aluno «inteligente e aplicado».
Filho de um chefe de estação dos Caminhos de Ferro de Benguela e pastor evangélico, Loth Malheiro Savimbi, e de Helena Mbundu Sakatu. Estudou no Colégio Marista do Bié, passou pelo Liceu do Lubango e veio terminar os seus estudos secundários no Liceu Paços Manuel, em Lisboa e aqui estudou durante dois anos na Faculdade de Medicina.
Enquanto esteve em Portugal foi detido três vezes pela polícia secreta portuguesa (PIDE). Savimbi fugiu para a Suíça em 1960 e formou-se em Ciências Políticas e Jurídicas pela Universidade de Lausanne, em 1965. O líder da UNITA juntou-se ao movimento contra o colonialismo português e na Europa, Savimbi conheceu membros dos dois principais movimentos políticos angolanos: o Movimento Popular para a Libertação de Angola (MPLA) e a União dos Povos de Angola (UPA).
Em 1961 filiou-se na UPA e rapidamente se tornou secretário-geral do Partido. Ajudou depois a criar a Frente Nacional para a Libertação de Angola (FNLA), um novo movimento político. À FNLA juntaram-se outros pequenos movimentos e foi criado o GRAE (Governo da República de Angola no Exílio) reconhecido pela OUA como representante do Povo Angolano. Savimbi é nomeado Ministro dos Negócios Estrangeiros desse governo no exílio.
No final do mesmo ano a FNLA lançou uma ofensiva contra o poder colonial português e as tensões entre os movimentos nacionalistas aumentaram. Savimbi deixou a FNLA em 1964 e viajou para a Europa de Leste, nomeadamente para a URSS. Um ano mais tarde recebeu treino militar na China, acompanhado de outros onze companheiros que com ele partilham a visão de que a luta contra o colonialismo português teria de ser feita de dentro de Angola, junto das populações que sofriam.
Regressa a Angola em 1966 fundando a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), que logo começou os ataques armados contra a potência colonial. Em 1967 foi detido na Zâmbia quando procurava apoios para a luta no interior do País. Libertado viaja para o Cairo e regressa de novo ao interior de Angola e continua a actividade clandestina contra o colonialismo português.
Os movimentos nacionalistas começaram a discutir o futuro político do país e a guerra continuou até 1974, altura em que foi derrubada a ditadura em Portugal e instaurada a democracia. O império colonial português começou a desintegrar-se e Angola tornou-se independente a 11 de Novembro de 1975. Ainda em 1974 e depois de assinar o cessar-fogo com Portugal é Savimbi que convence os outros dois movimentos a assinarem o cessar fogo.
É ainda a seu convite que se realizam durante este processo três cimeiras entre os Movimentos. Primeiro em Campala, Uganda onde os três concertam uma posição para as conversações com Portugal em Alvor, depois em Mombaça no Quénia e em Nakuru também no Quénia na tentativa de salvar o processo de Paz então em curso. Mas as conversações de Paz não resultaram porquanto o MPLA tinha decidido com o apoio da URSS e de alguns sectores portugueses assaltar o poder.
Assim levou a efeito um ataque militar contra a FNLA e a UNITA. Depois da independência, as tensões entre os três movimentos nacionalistas resultaram num conflito armado. O MPLA recebeu armas da URSS e o apoio de tropas cubanas, enquanto a UNITA recebeu ajuda financeira e militar da África do Sul e de outros países ocidentais como os Estados Unidos.
No período que medeia 1974 e 1990 Savimbi tenta sem êxito entrar em conversações de Paz com o MPLA. Em simultâneo vai alargando no terreno a influência militar da UNITA, e construindo por todo o mundo a imagem de um Movimento que lutava contra a ditadura comunista então existente em Angola.
Finalmente em 1990 pressionado pelas acontecimentos mundiais e pela derrota militar no terreno angolano o MPLA aceita negociar a Paz e introduzir o multipartidarismo e as eleições em Angola. Seguem-se eleições em nos finais de Setembro 1992, cujos os resultados artificiosos a UNITA aceita em 14 de Outubro. Mas apesar disso o MPLA leva a cabo um golpe de estado, assassinando os principais dirigentes da UNITA em Luanda, e massacrando mais de vinte mil cidadãos na capital.
A guerra civil recomeça e arrasta-se até 2001. Várias tentativas são feitas para que ela acabe. Em Dezembro de 2001 a UNITA aceita por intermédio da ONU o restabelecimento da Paz e o cessar-fogo. Mas antes que tal seja feito o MPLA ataca a zona onde Jonas Malheiro Savimbi estava e este é morto em combate a 22 de Fevereiro de 2002.
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