O Arauto

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segunda-feira, dezembro 18, 2006

Quo Vadis comunicação social estatal?

A extremosa atenção dispensada pela TPA e a RNA ao 50º aniversário do MPLA voltou a colocar na agenda política nacional a questão do serviço público de informação versus governamentalização/partidarização dos meios de comunicação social estatais.
Por: Wilson Dadá
Mesmo habituados que já estamos todos ao exagero total, com contornos absolutamente escandalosos, na definição e distribuição dos espaços mediáticos, como sendo o principal critério dos editores das duas estações na cobertura das actividades do maioritário, desta vez fomos completamente surpreendidos com o regresso do MPLA à sua condição antiga de Partido/Estado.
Na altura, como se sabe, o MPLA era, por imperativo da própria lei constitucional que o seu Comité Central aprovou, a força dirigente do país em representação do povo angolano. Um mandato que o vitorioso MPLA tinha conquistado a ferro e fogo sobre os seus mais directos rivais, que, de legítimos representantes do povo angolano nos Acordos do Alvor, foram despromovidos para a categoria de fantoches e lacaios do imperialismo.
"Ao MPLA seu legitimo representante [do povo angolano] constituído por uma larga frente em que se integram todas as forças patrióticas empenhadas na luta anti-imperialista cabe a direcção política económica e social da Nação"- assim rezava a Constituição de 1975.
De facto quando uma declaração do MPLA é transmitida na íntegra antes do noticiário principal da TPA, e com direito a hino (do partido) na RNA, só podemos estar diante do regresso em força ao regime do Partido/Estado, com que este país palmilhou os primeiros 15 anos da sua independência.
Passaram-se, entretanto, mais de 14 anos desde que o monopartidarismo foi enterrado na tragédia eleitoral de 1992. Angola, note-se, é desde 1992 "um Estado democrático de direito" onde "os partidos políticos têm direito a igualdade de tratamento por parte das entidades que exercem o poder público, assim como a um tratamento de igualdade pela imprensa, nas condições fixadas pela lei".
Estes direitos são fundamentais.
Estão inscritos na nossa nova constituição, um documento que é permanentemente ignorado por muito boa gente deste país que prefere ler outras cartilhas que estão bem mais perto dos seus corações e dos seus interesses pessoais, no âmbito das suas ambições na luta permanente pelo poder em que estão envolvidos nos respectivos quintais partidários.
Foi a primeira vez nesta Segunda República que uma mensagem do MPLA recebeu um tal tratamento na comunicação social estatal, a coincidir com a estreia do Comité de Especialidade dos Jornalistas, que realiza assim a primeira grande façanha da sua história recente. Efectivamente nunca se tinha ido tão longe e tão fundo na partidarização da comunicação social pública, esbofeteando-se de forma tão grosseira os próprios postulados constitucionais.
Estamos convencidos que nem mesmo na primeira República alguma vez uma mensagem do MPLA lida por alguém que não fosse o seu Presidente teve o tratamento que nos foi dado a observar a semana passada. Enquanto aguardarmos por outros esclarecimentos, sinceramente não acreditamos que alguém da cúpula do MPLA tenha orientado os editores da TPA e da RNA, enquanto membros do Comité de Especialidade dos Jornalistas, a conferirem tamanho destaque à sua declaração por ocasião do 50º aniversário lida pelo "jovem" Kwata Kanawa.
A "proeza" teve de facto a assinatura do Comité da Especialidade e é da exclusiva responsabilidade dos editores de serviço no dia em que conseguiram ultrapassar todos os limites da sua militância, oferecendo ao MPLA esta "soberba" prenda de aniversário.
Um presente que só pode envenenar ainda mais o clima à volta do desempenho da comunicação social estatal a dar razão a todos quantos estão convencidos que a fraude eleitoral já está em marcha. É o pior que poderia acontecer ao processo preparatório das eleições.
No seu afã de apresentarem serviço, os responsáveis da comunicação social estatal estão a oferecer diariamente munições para todas as armas de arremesso que neste momento estão apontadas contra o Governo.
Com efeito não pode haver eleições justas e livres, quando o principal e mais poderoso espaço de comunicação com o eleitorado está totalmente dominado pela presença apenas de um dos contendores. A manter-se esta tendência é fácil de prever que os conflitos se vão agravar, que as reclamações se vão multiplicar e que a comunicação social estatal se vai transformar no principal palco da discórdia do processo preparatório das eleições.
Lamentavelmente.
O excesso de zelo dos operadores do sistema é claramente neste momento a principal causa deste desempenho desastroso para os interesses do próprio país. É altura do MPLA ao mais alto nível, tendo em conta as suas grandes responsabilidades em todo este processo, fazer uma avaliação da situação para ver se de facto é por aí que deseja que a comunicação social estatal continue a caminhar e a tropeçar em tudo quanto seja lei e bom senso.
Se de facto assim for, se de facto os camaradas do topo chegarem à conclusão que os seus camaradas da base estão a trabalhar bem, aí só nos resta esperar pelo pior, sem o desejarmos.


Fonte: Angolense