O Arauto

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sexta-feira, janeiro 26, 2007

Carta do ministro da cultura cabo verdiano para Tito Paris

O ministro da Cultura, Manuel Veiga, reagiu às recentes declarações de Tito Paris ao jornal "Expresso das Ilhas" sobre a música de Cabo Verde. Em entrevista aquele órgão, publicada na semana passada, o artista radicado em Portugal diz, entre outros aspectos, que nunca recebeu nada do Governo de Cabo Verde, que nomes como Cesária Évora e B.Léza não são valorizados e que a música de Cabo Verde está em extinção, mas só no próprio país.


Caro Artista Tito Paris,

Praia, 23 de Janeiro de 2007

Tomei conhecimento, com alguma surpresa, das declarações feitas, por si, na entrevista publicada no Expresso das Ilhas nº 267, de 17 de Janeiro de 2007.

Cabo Verde inteiro - o seu povo, mas também os sucessivos Governos - o tem acolhido como um artista que nos orgulha a todos, não apenas como natural de S. Vicente, mas sobretudo como um artista de dimensão nacional.

O Governo a que pertenço interpreta a cultura como o fôlego da Nação, a força anímica que nos une, que nos especifica, que nos estimula ao diálogo, à inovação, à criatividade e ao desenvolvimento. É esta força da cultura que já nos convenceu - nós Governo, mas sobretudo nós Povo de Cabo Verde - que a sobrevivência da Nação depende da nossa unidade cultural.

Daí que a cultura não tenha e nem deva ter partidos. Daí que a discriminação cultural não seja e nunca será uma prática da política cultural deste Governo e do Ministério sob a minha responsabilidade.

Concordo com o artista Tito Paris quando diz que «a riqueza da cultura cabo-verdiana mora aqui», isto é em Cabo Verde; quando diz ainda que a nossa música é pouco estudada, que ela deve ocupar um espaço maior na Rádio e nas discotecas, que os recursos do Ministério da Cultura são limitados. Essas observações devem merecer uma análise e uma reflexão adequadas do Governo, mas também da Nação.

Porém, não posso concordar com o artista Tito Paris quando diz: “a música de Cabo Verde está em extinção, só em Cabo Verde” ; que ninguém se lembrava de Cesária, de Jotamonte, de B. Leza e do próprio Tito Paris, porque são de S. Vicente.

Não posso concordar ainda quando diz que «há cerca de seis / sete anos que anda atrás de um patrocínio para trazer uma orquestra para Cabo Verde e ninguém liga, quando... dão milhares de contos para determinados projectos, apenas por razões políticas”.

Continuo a não concordar consigo quando afirma «O Estado de Cabo Verde nunca investiu nada em mim. No meu caso, tenho que agradecer Portugal, de coração. Agradecer aos seus governantes e ao seu povo. E isto deixa-me triste, por outro lado, porque não tive esse reconhecimento e carinho da parte das autoridades do meu País, e isso por um motivo bobo, porque partidarizam e politizam a cultura... E muitas vezes, somos penalizados, isto porque existem aqueles que declaram que são a favor do partido que está no Governo e são beneficiados. E entregam-lhes dez ou vinte mil contos para irem fazer o que quiserem».

Não posso concordar com todas essas afirmações porque elas não correspondem à realidade. Com efeito, a Cesária tem sido a «diva» de todos nós, aclamada e proclamada pelas autoridades, mas também pelo povo de Cabo Verde, tendo sido condecorada por duas vezes, uma com o 1° Grau da Medalha do Vulcão e outra com a 1ª Classe da Ordem do Dragoeiro, para além de uma moradia que o Estado de Cabo Verde pôs à sua disposição. O B. Leza emprestou o seu nome ao nosso 1º Boieng. Eu mesmo, como cidadão e como homem de cultura, pertenci ao júri e fui eu quem apresentou as fundamentações que foram votadas por unanimidade. Em Abril de 2007 vai ter lugar um Simpósio sobre o 1º Centenário da Geração do Movimento Claridade, e B. Leza faz parte dos homenageados. O Instituto da Biblioteca Nacional e do Livro patrocinou a edição de um trabalho de investigação sobre B.Leza, da autoria da jornalista Gláucia Nogueira, com o título de No Tempo de B.Leza.

O próprio Tito Paris contou com um apoio simbólico do Ministério da Cultura em 2006 (ver documento anexo, inclusive a fotocópia do cheque emitido e recebido).

Mais: eu próprio testemunhei a condecoração de Tito Paris em 2005, por ocasião do Trigésimo Aniversário da Independência Nacional.

Quanto à atribuição «de dez ou vinte mil conto» para artistas que são a favor do partido do Governo estou em condições de lhe dizer que não corresponde a verdade. Mesmo que quisesse, o limitado orçamento do Ministério da Cultura não permitiria a prática dessa barbaridade e dessa exclusão.

Espero ter esclarecido ao artista Tito Paris, eu que, sem lhe dar «palmadinhas nas costas» sou também seu admirador.

E se me dei ao trabalho de lhe escrever esta longa carta é porque reconheço o contributo que tem dado e continua a dar à nossa música. Para mim é e continua a ser um parceiro fundamental da nossa política cultural em Cabo Verde e no mundo. Interpreto as inverdades de alguma das suas afirmações como falta de informação ou então como resultado de desinformação de que, provavelmente, terá sido vítima.

Estando no início do novo ano, termino fazendo os meus melhores votos para a sua carreira artística, mas também pelo sucesso da vida cultural em Cabo Verde e no mundo. Digo isto com toda a sinceridade, eu que em outras ocasiões já lhe dei provas da minha amizade e solidariedade

Melhores Cumprimentos,

Manuel Veiga

Ministro da Cultura

C/C

Jornal Expresso das Ilhas

Representante do artista Tito Paris em Cabo Verde,

Sr. Aldino Cardoso


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