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sexta-feira, junho 09, 2006

Posse do bispo de Cabinda amanhã poderá ajudar a melhorar a situação no enclave?

O novo Bispo de Cabinda, D. Filomeno Vieira Dias, toma posse sábado numa cerimónia de grande significado para a evolução da situação do enclave, única parcela do território angolano onde permanece alguma instabilidade.
O bispo foi nomeado há 16 meses pelo Papa João Paulo II, mas a sua posse foi sucessivamente adiada pela hierarquia da igreja devido à forte contestação de parte do clero e da comunidade católica local, que rejeitam a escolha de um bispo que não seja natural daquela região do norte de Angola.
A contestação originou vários incidentes e agressões a membros da hierarquia da Igreja Católica que se deslocaram ao enclave para tentar resolver o diferendo, tendo mesmo provocado o encerramento das igrejas de Cabinda durante vários meses devido a um protesto dos sacerdotes locais.
A comunidade católica de Cabinda nunca questionou as qualidades do bispo escolhido pelo Vaticano, mas rejeitava que o titular da diocese fosse alguém que não tivesse nascido no enclave.
Em causa está o receio de uma alegada tentativa de controlo da igreja de Cabinda por parte do regime no poder em Luanda, agravado pelo facto de D. Filomeno Vieira Dias ser parente do general Hélder Vieira Dias 'Kopelipa', que é o Chefe da Casa Militar do Presidente da República e uma das personalidades mais influentes na actual estrutura do poder em Angola.
D. Filomeno Vieira Dias vai substituir D. Paulino Madeca, que resignou por ter atingido o limite de idade e cujo mandato à frente da diocese foi marcado por várias posições públicas que manifestavam uma grande proximidade e compreensão com os interesses independentistas do enclave de Cabinda, de onde provém a maioria do petróleo produzido no país.
O anúncio da tomada de posse do novo bispo ocorreu pouco depois do ministro do Interior angolano, Roberto Leal Monteiro 'Ngongo', ter efectuado uma visita a Cabinda, durante a qual revelou que o Governo está a negociar a criação de condições para a normalização da situação no enclave.
«Este é um problema político, temos de conversar porque é com o diálogo que os homens se entendem», afirmou o ministro, que também coordena o grupo de acompanhamento do Conselho de Ministros para a província de Cabinda.
No final de Março, o primeiro-ministro angolano, Fernando Dias dos Santos, tinha afirmado no parlamento que a situação em Cabinda estava a evoluir de forma «francamente positiva», admitindo a possibilidade de ser atribuído um «estatuto especial» ao enclave do norte do país.
Na altura, Fernando Dias dos Santos admitiu que poderá ser atribuído a Cabinda «um estatuto especial no sentido do reforço da capacidade de coordenação provincial e de administração local», acrescentando que poderá ser encontrada uma solução «no quadro da transferência para a província» de determinadas competências actuais do poder central.
O enclave de Cabinda é palco desde 1975 de uma luta armada independentista liderada pela Frente de Libertação do Enclave de Cabinda (FLEC), que alega que o território ainda é um protectorado português nos termos do Tratado de Simulambuco.
O Tratado de Simulambuco, assinado a 01 de Fevereiro de 1885, serviu para Portugal defender na Conferência de Berlim, que estava a decorrer na altura, os seus direitos sobre Cabinda, território que era pretendido pela França, pelo Reino Unido e pela Bélgica.
O documento, assinado pelos príncipes e governadores de Cabinda, colocava o território sob o protectorado de Portugal, tornando os habitantes súbditos da coroa portuguesa.
A existência desta tendência independentista, várias vezes minimizada por responsáveis políticos e militares angolanos, justifica a forte presença militar no enclave, que é a única parcela do território onde ainda permanece uma situação de instabilidade, depois do fim do conflito armado em 2002.
Os soldados das Forças Armadas Angolanas (FAA), assim como os elementos da Polícia Nacional que se encontram no território, têm sido várias vezes acusados de violação dos direitos humanos pelos movimentos independentistas e por organizações da sociedade civil.
No final de Janeiro, a Associação Cívica de Cabinda 'Mpalabanda' denunciou a existência de um clima de «tensão» na capital do enclave, revelando que a cidade vivia num «verdadeiro estado de sítio» devido a uma forte presença de efectivos policiais e militares nas ruas que visava impedir a realização das iniciativas destinadas a assinalar o aniversário da assinatura do Tratado de Simulambuco.
Periodicamente, esta associação denuncia a alegada existência de casos de prisões arbitrárias, violações e mortes de cidadãos em Cabinda pelas forças de segurança, criticando o que considera ser a «apatia» da comunidade internacional sobre a situação no território.
Para inverter a situação, a Mpalabanda chegou a defender a nomeação pelas Nações Unidas de «um relator especial dos direitos humanos que investigue os crimes praticados em Cabinda».
A existência de excessos por parte de elementos das forças armadas chegou a ser admitida pelo governador provincial, Aníbal Rocha, frisando, no entanto, que os casos detectados foram julgados e não podem ser generalizados.
A posse do novo Bispo da Diocese de Cabinda e as negociações que o Governo afirma estarem em curso, que poderão culminar com a atribuição de um estatuto especial para aquele província, podem conduzir a uma importante evolução da situação neste território com 7.270 quilómetros quadrados e cerca de 400 mil habitantes.

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